domingo, 29 de março de 2015

Corrupção X Práticas abusivas das grandes empresas: quem prejudica mais o bolso do brasileiro?

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Em recente artigo publicado na Inglaterra com o título “O Brasil que ainda não acordou”, o qual teve como objeto central de estudo as relações de consumo no Brasil, verificou-se que, enquanto a população se indigna com os atos de corrupção dos políticos e administradores públicos, em sucessivos escândalos de repercussão global, não percebem que dentre as imoralidades aqui ocorridas, aquela que  possivelmente mais cause prejuízo aos brasileiros  não está diretamente ligada à corrupção, mas sim ao desrespeito e imensuráveis lesões a que a grande maioria dos cidadãos é submetida nas suas relações com as grandes empresas, concessionárias ou não de serviços públicos.

Acerca do tema, narra o autor em seu artigo que, como forma de se ressarcir da pesada carga tributária e encargos trabalhistas praticados em nosso país, boa parte das grandes empresas utiliza, como meio de compensação, um conjunto sistematizado de práticas espúrias que lesam os consumidores das mais diversas formas e, consequentemente, engordam o seu faturamento.

O Estudo observou que a matemática utilizada pelas grandes empresas é simples, é parte do princípio de que a cada 10 consumidores lesados, em média, apenas 1,8 deles procuram o judiciário para buscar o seu direito, fato este que acaba estimulando os empresários a continuarem apostando em cláusulas abusivas, cobranças indevidas, vendas casadas e outras práticas vedadas pela norma consumerista, uma vez que o lucro indevido obtido junto aos oito consumidores lesados que se mantêm inertes, asseguram um razoável saldo positivo, mesmo após o ressarcimento e indenização daqueles que acionam o judiciário para garantir os direitos.

Os pesquisadores concluíram que no Brasil, duas sãos as razões que tornam atraente e lucrativo o mercado do “black profit”, sendo eles:  a falta de esclarecimento dos consumidores, em especial os das Classes “C” e “D” acerca de seus direitos e garantias, e os baixos valores aos quais as empresas são condenadas a título de reparação de danos materiais e morais ao consumidor.

Como fonte de inspiração e indício científico que embasa seu artigo, o autor inglês cita o levantamento feito por pesquisadores ligados a Universidade de Cambridge, na Inglaterra, considerada a terceira melhor universidade do mundo, o qual revela que no Brasil, o prejuízo dos consumidores acarretado pelo comportamento abusivo das grandes empresas, ultrapassa a casa dos 85 bilhões de reais ao ano, ou seja,  aproximadamente 24% a mais do que aquilo que o Brasil perde anualmente com a corrupção, a qual, segundo um estudo realizado pelo Departamento de Competitividade e Tecnologia (Decomtec) da Fiesp (Federação das Indústrias de São Paulo) chega a R$ 69 bilhões de reais por ano.

Não podemos deixar de tratar essa conduta praticada desfavor do consumidor brasileiro como uma espécie de corrupção ou de imoralidade, mesmo porque, as campeãs de reclamações são justamente as empresas que prestam serviços públicos (telefonia, água, luz, entre outros), seguidas por companhias aéreas, bancos e seguradoras, setores que embora não sejam propriamente serviços públicos, sofrem forte regulação do Estado.

Considerando que o PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil no ano de 2013 foi de cerca de 4,8 trilhões de reais, segundo fontes oficiais do governo, é possível afirmar que, não fosse corrupção e o “black profit” esse índice poderia ser quase 4% maior.

Muito embora num primeiro momento esse percentual pareça irrisório, ele se agiganta se considerarmos que o crescimento da economia brasileira entre 2012 e 2013 foi de apenas 1,6%.  Logo, se o Brasil não estivesse entre os países com políticos e empresários mais corruptos do mundo, poderíamos ter índices de crescimento econômico muito mais significativos, aproximando-se da evolução alcançada por China e Índia.

Diante desse cenário, uma pergunta que surge é: Como mudar essa situação, o que podemos fazer?

A resposta é simples:
Em relação à corrupção no setor público, o primeiro passo para combatê-la é realizar melhores escolhas nas eleições, evitar a perpetuação dos mesmos políticos no poder, pesquisar a vida pregressa dos candidatos, desconfiar daqueles que fazem muitas promessas e fiscalizar aquilo que nossos mandatários tem feito com o nosso dinheiro.

Quanto aos abusos praticados nas relações de consumo, o melhor caminho é fazer valer os nossos direitos, não deixar de procurar o judiciário cada vez que for identificada uma cobrança indevida, uma propaganda enganosa, uma cláusula leonina ou ainda uma venda casada, pois quanto mais consumidores procurarem seus direitos, menos vantajosa será a política do lucro negro (Black Profit).

Outra prática interessante, seria a de divulgar aos quatro ventos, via redes sociais, toda vez que uma empresa estiver praticando atos que lesem ao consumidor.

Nesse sentido, assim como as empresas se utilizam dos órgãos de proteção ao crédito (SPC/SERASA) para se proteger dos inadimplentes, é lícito que os consumidores, mesmo que informalmente, criem listas de proteção contra as empresas que desrespeitam as normas consumeristas. Essa prática já é utilizada nos Estados Unidos e Europa, a ponto das grandes empresas contratarem pessoas para monitorarem constantemente as redes sociais e identificar o mais rápido possível reclamações e clientes insatisfeitos, entrando em contato com os mesmos e evitando dessa forma que o “marketing negativo” se espalhe por toda a internet, comprometendo os negócios da empresa.

Por fim, é oportuno destacar que a pratica lesiva das grandes empresas nos prejudica como consumidores, atingindo nossos interesses coletivos, enquanto, por outro lado, a corrupção nos atinge como cidadãos e alcança nossos direitos difusos.

Assim, respondendo à pergunta inicial proposta no presente texto, é possível concluir que não existe uma forma de se mensurar qual conduta é mais lesiva ou qual atinge de forma mais direta o bolso dos brasileiros. A única coisa certa é que cabe a cada um dos brasileiros, seja como cidadão ou como consumidor, combater toda e qualquer forma de corrupção e desrespeito a nossos direitos e garantias.

Texto de Thiago Freire, advogado e professor universitário do Centro Universitário Luterano de Ji-Paraná.

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